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João Bosco do Nordeste
Professor Mestre em Educação e Administrador empreendedor
Textos
Terremoto partindo o trabalhador
TERREMOTO PARTINDO O TRABALHADOR

O chão se abalava na sala onde um poderoso, ouvindo músicas num som muito caro e vendo TV, não se preocupava. Ninguém o incomodava com as explosões ocorrendo nas imediações. Estava protegido pelo poder constituído, e muito bem guarnecido. Não ligava não. Pensava que o poder de controlar os trovões estava em suas mãos.
Tomando o seu whisky importado, sorrindo da desgraça dos outros, bem humorado consigo mesmo, continuava sentado em sua cadeira presa no solo dentro da sala em sua mansão. Enganando o seu espírito, antes aventureiro, ouvia muitos gritos de desesperos de pessoas do lado de fora, em passos ligeiros, correndo como num formigueiro, mas ele não liga. Sabia que não era com ele.
Ele estava acima de tudo. Ouvia os estrondos, mas queria mesmo era dormir, tomava mais uma vez o remédio de tarja preta para chegar o sono, enquanto naquele momento tudo estava indo ao chão.
- A casa caiu - Grita a polícia, na sua falta de consciência, como uma doce ilusão.
Repetem os tremores, parece motores de tanques de guerra explodindo ao redor. O teto já não existia mais, faltava terra em seus pés. Agora sofrendo de dor, não acredita no que pode estar acontecendo, pois já estava acostumado a ouvir notícias do poder dizendo sempre que tudo estava bem. Mas será que agora ele foi enganado pelos seus asseclas? Pelos seus que dizem ser seu? Na situação em que se encontrava não poderia mais enganar a ninguém, os seus olhos viam grades e pensava em certos momento que seriam de cervejas.
O sentimento de culpa invade o seu corpo, mas não o seu coração de pedra, e sabe a razão, pois enganou tanto que o engando passou a lhe enganar. Agora o seu mundo é pequeno, preso naquele hora numa cadeira quebrada dentro de um quarto isolado, tentando entender o ocorrido apenas como uma vil correnteza de perversidade, uma traição dos asseclas: é a calamidade! Está preso sem ter mais o poder que pudesse fazê-lo se mexer.
O torpor tomou conta de si, como se estivesse ocultando algum velho hilo, mas velho mesmo foi o seu mundo imundo, já tão estragado por dentro e por fora numa forja de mil furacões, como consumidores nas liquidações. Ele mesmo havia mandado o povo comprar tudo fiado, deixando todo mundo lascado, como uma grande bola de neve num país tropical, perdendo a companhia inesperada de alguém do seu lado, que não poderia mais ficar.
Por mais que andasse fugindo, naquele momento, o tormento o encontrou, não podia mais usar as dimensões da riqueza e da ostentação, pois o universo o quis condenar pelo seu orgulho, não dando mais lugar aonde pudesse se ocultar, a não ser embaixo de entulhos.
Ele não desistiu e quis gritar em cima de um carro de som, mas só ouvia os surdos, e por isso continuava entalado em sua cadeira, sempre bêbado, esperando o poder dos homens o salvar o seu poder de novo, mas viu que o seu mundo estava perdido, pois depois dos estrondos ninguém iria mais achá-lo, pois o povo passou a pensar.
Algumas vezes, em poucas vezes, abriu os olhos, mas não viu mais quase nada, tudo ficou escuro ao seu lado. Estava preso na sua ignorância, prepotência e desfaçatez, no chão da casa, agora sem sacadas de vista para o mar ou espaços marcados em seu avião, e nenhum sítio aonde alguém pudesse lhe doar. A escravidão do pecado começou e quem engana não percebe quando lhes enganam.
Quer conservar-se ainda imune aos tremores, esquece seus pudores quase sempre impunes, que tomam novos rumos e novas dimensões, com o terremoto acusando, julgando e sentenciando, num lapso insuficiente de tempo. O tempo não volta atrás, mas os crimes deixam sempre rastos e voltam do passado de forma traiçoeira. Ele grita aos supremos amigos, pagando muito caro aos defensores, que ficam cada vez mais ricos, livres, e ele preso. A sua voz ninguém pode mais escutar. Ele nem pode se levantar. Não dá mais tempo, porque os motivos não lhes dão mais razão. O que fez com a vida?
Naquela cadeira entrega o seu corpo que a vida tisnou. Sentado ali como se fosse seu em seu trono, frágil no seu abandono, mostra que agora não é mais ninguém. Nem rei, nem imperador, apenas mais um corrupto que na história ficou com as mãos sujas com a lama do petróleo da riqueza enterrada de volta de onde jamais deveria ter saído.
O resto em pedaços, virando bagaços, tudo em si é escombro. A sala é um assombro, fica mais escura a cada instante, e até mesmo nem existe mais a sala. Ninguém pula o muro para lhe defender que não seja pago caro, e ninguém mais se abala para lhe salvar. Os bombeiros procuram, mas sequer encontram o corpo nesses escombros. Não existe sequer um ombro amigo limpo onde possa descansar a cabeça pesada, todos estão podres de sujeiras também, e também nenhum ombro o aguentaria.
Silêncio! Tudo agora parece uma calmaria, e ele que nunca viu e nem escutou nada mesmo agora só estava preocupado em se manter no poder, vexando um mundo frenético parado, não sabe depois para onde irá. Vivei metido a inocente, e nem mesmo a doença terrível lhe serviu de recado. Tenta às vezes virar-se de lado, mas seu corpo já está nu e todo mundo vê, tanto os asseclas ou não, percebem que o sabido sempre quis se esconder desse terremoto. Vejam, o rosto já não tem mais aqueles cremes caros, cabelereiros especiais, roupas americanas de marca, e os passos lentos serrados nas pernas que não o levam mais do que a poucos metros a destinos que os olhos da cara não podem mais comprar. É um personagem que nasceu sem bagagem, e quis roubar as bagagens de uma grande população, conquistando tudo de uma só vez, levando consigo os mais chegados amigos, encarnando à riqueza sem limites, com o seu vil proceder.
No terremoto aumenta a ausência de qualquer esperança no seu desespero. Plantou pardieiro e virou fazendeiro. Na vida o que resta? Um porco não pode cantar como um galo, quer seja em falsas palestras ou ajudas ao amigo que deixou de ser secreto, pois palestra não existe mais, e ninguém pretende ouvir mais os seus desmandos a mando de ninguém. E agora?  
Chega um vulto negro em betume dentro dos seus olhos como a lembrança de uma delação, e lembra das poças de lama que pisou muitas vezes, colocando postes para iluminar os outros com dinheiro de outros, mas naquele momento apagado perdia também o valor, porque não podem mais dar luz naquele ambiente inóspito. Até uma prévia do sal que em certos momentos gerou muita propina, entre fraudes e ilícitos estão indo agora por terra abaixo, e nem as mãos sujas consegue limpar. Esse vulto negro veio cobrar também.
Naquela cadeira ele até tenta se estirar, mas com as pernas quebradas não sai do lugar. Queria ver a luz que estava lá fora, mas nem mesmo essa poderá ver agora. Pensa que a janela pode estar aberta, mas não existe mais porta ou janela, e nem saída. O mundo não existe mais ... aquele mundo de celebridade desabou. Tenta abrir os olhos e encontrar aquilo que o palácio lhe deu, mas também causou tantos pesadelos. Triste ilusão.
- Não me deixem só! - Tenta gritar, como outros já o fizeram.
Continua ali dentro, embaixo das ferragens e percebe que perde um dos dedos, e por isso também vai prestar contas. Agora parece uma estátua embaixo de muitas itaqueras, esperando sua estátua, e vai desanimando com as descobertas. A cada barulho que mexem com o entulho na rua é só desespero, pois agora não adianta mais ter dinheiro, com o corpo parado, danificado e todo enrolado de entulhos da sustentação do prédio, não existe remédio que o possa salvar. Viu os falsos amigos e capachos fugiram, e de tanto viverem em situação de desprezo e por baixo, agora também querem vê-lo descer.  
Não passa um minuto, vem outro tremor, outra delação, trovões e explosões que vão consumindo o seu teto, virando tudo chão. Falta terra nos pés, e agora a justiça parcial não o pode mais amparar, o Supremo não se acovardou e não adianta chamar por Deus, pois em quem nem tem religião, nem Deus acredita. Na época das vacas gordas, nem que a vaca tossisse não queria conhecer a sua opulenta riqueza, sempre pensando que seria se tornaria imortal, como uma ideia suja e incopiável. Nunca entendeu que uma doença é o avido de parar.
Ficar rico era preciso e falta de aviso da dama primeira não foi. Andava às escondidas em meio a seus comparsas mentirosos, levando-o abeira do precipício em carros e aviões de luxo, e nunca se mostrava desconfiado com tudo isso. Para a imprensa, mostrava tudo como solução, com dinheiro na mão era só autorizar comprar uma vacaria de pau lost (perdido) para pagar um João Moura a precificação da maquiagem, esquecendo que depois num determinado local, dentro do entulho em seu terremoto pessoal, poderia ser devastação. A abastança e a fartura cegaram o amor, transformando família em laranjas, e embaixo dos escombros ficou difícil enviar comandos e ninguém quer mais dar ajuda ... sua voz ficou muda. Virou um "Deus nos acuda". A mansão tripla não existe mais, tem dois apartamento num mesmo andar, mas lá não pode mais andar. Abriu uma grande vala na sala de orgulho e até prepotência, juntando entulho e fartura, e sua grande fortuna não vale mais nada, é o fim da estrada, viagem sem volta até mesmo sem escolta num trajeto final.  Fim melancólico, uma trágico-comédia.
Ao sentir-se sozinho sem bajulador ao seu lado, pensou no seu passado, cadê vocês? Juntou muito gado, prédios e aviões, mas nenhum tostão agora daquela cadeira de onde ninguém mais pode retirar. Nem pode chorar o leite derramado, pois nunca teve consciência do valor das vacas.
Num reflexo de atitude um tanto sem nexo, grita sua arrogância, na qual se sentia maior que um gigante, maior que o próprio Deus, por se achar mais popular que Jesus. O seu psiquiatra morreu sem conseguir tirar-lhe desse complexo de gigante de lama.
Infelizmente, quando chegar a hora, na eternidade vai vagar devagar, colhendo seus frutos que plantou na sua "faculdade" da desonra, onde fez dos indigentes os degraus de sua escada de milhões, dando esmolas aos cegos e analfabetos pobres, para se manter no poder e manter seu patrimônio, fazendo dos amigos comparsas e laranjas. Mas como todo animal ou cobra que deixa o rabo preso, agora está naquela cadeira, e preso não foge mais. O pânico de quem deve é temer o diabo que cobra por derradeiro o pacto que faz com os milionários da Terra, numa vida tão passageira, que deviam entender.
Jaz quase desfalecido, ele não sabe ao certo o seu nome, pois agora não importa, carregado o corpo, não serve para mais nada, e a história derruba castelos de areia, de uma vida corrupta e cheia de armação comprada, que não conseguiu aguentar esse terremoto. Uma situação precária e sem estribilho ... cheia de sarilhos.
Um grande silêncio invade o resto da mansão que antes era só riqueza. Aquela fortaleza foi derrubada, guardada pra nada, em promessa de continuidade de um projeto escrito em pedras de gelo, que derrete no calor do sol das ilusões do inferno e a estrela acabou no chão. Abre-se uma fresta de uma luz vermelha em fogo.
Tudo consumado e do inferno chega uma procissão, levando o corpo deformado e a alma sem salvação.
Abre-se o caixão ... Pegam-no do chão ... Coloca-o para dentro ...
Acaba aquele ciclo ... Fecha-se o caixão.

- Conto do autor, no Livro Rapsódia de um contador de histórias, Editora Becalete, 2018.
João Bosco do Nordeste
Enviado por João Bosco do Nordeste em 20/08/2014
Alterado em 28/11/2018
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