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João Bosco do Nordeste
Professor Mestre em Educação e Administrador empreendedor
Textos
Um caipira numa agência bancária - Parte 2 – O cadastro
Um dia de segunda feira, com a agência bancária cheia de caipira numa cidade de interior entra o caipira Bil acompanhando do seu sobrinho, um jovem de uns 20 anos. O diálogo abaixo é centrado entre o gerente de conta de pessoas físicas e o cliente caipira. Como vimos na visita anterior ao banco (um caipira numa agência bancária nº 1), o gerente marcou para que o caipira voltasse na data marcada e fizesse o cadastro, a fim de possibilitar um financiamento para a área rural.
- Bom dia senhor, no que posso servi-lo?
- Não quero ser servido em nada, não tô com fome. Quero fazer meu cadasso.
- Ah sim! O cadastro. Mostre seus documentos.
- Tá doido? Na frente de todo mundo?
- Quero dizer, mostre o CPF, identidade, essas coisas, entendeu?
- Ah sim. Toma ai, tá tudo dentro deste pocapiu.
- Como é o seu nome mesmo?
- Tá vendo ai não? É “pode butá”. Quer dizer é como o povo me conhece.
- Como “pode botá”? Estou vendo mesmo escrito aqui na identidade.
- Meu pai contou que lá na roça foi no cartório para me registrar com o nome de Sivirino, mas quando o homem do cartório perguntou se podia butá o nome, ele disse “pode botá”. O home do cartório butou no papel Severino pode butá.
- Rapaz, eu nunca pensei que eu iria ver isso num banco. Entendi. E mesmo assim o senhor é casado?
- Sou.
- Como é o nome da sua cônjuge?
- Não é com juzé. É minha mulher há mais de 30 anos..
- Certo. Como é o nome da sua mulher?
- É dinha.
- Como?
- Derna que eu namorei eu conheci ela como dinha.
- O senhor depois vai me trazer a identidade dela, quando vier apresentar a proposta do seu financiamento, viu?
O gerente vira-se para o rapaz e pergunta se ele sabia ler. Ele responde que sim. Pegou o formulário e entregou ao rapaz para preencher umas informações perguntando ao velho, enquanto ele iria se levantar para buscar um documento na máquina copiadora. Ao voltar, o rapaz diz que o velho só respondeu uma pergunta que foi: sexo.
- O que ele respondeu, perguntou o gerente.
- Ele disse que apesar de acontecer algumas falhas, às vezes ainda funciona.
- Não era isso. O sexo dele é masculino. Era só botar um “x” aqui, nesse lugar. Deixa pra lá. Onde o senhor mora?
- Numa casinha lá no oiteiro da roça, caindo os pedaços.
- Qual é o endereço que o correio entrega as cartas?
- Qui correio? Qui cartas? Nunca vi correio correr por lá.
- Vou colocar então que o senhor mora num lugar sem número nenhum.
- Como sem número? Tudo meu tem número, sapato, calça, camisa ...
- Não é isso. Vamos continuar. O senhor tem escritura?
- Escritura não tem não, mas identidade o senhor já viu.
- É escritura da terra, a certidão de nascimento da terra.
- Deus me livre. Nunca vi dizer que terra foi nascida da barriga de ninguém.
- Esquece; O senhor tem algum bem?
- Agora falou bonito. Tenho a roça de dinha, que ela casou comigo e me deu, tenho mais 10 filhos e mais 1 cavalo e mais duas éguas, seis porcos castrados, 20 galinhas poedeiras ...
- Tá bom, tá bom. Não precisa mais falar de bens. Como é o nome da fazenda?
- Que fazenda? É roça mesmo. O nome é lagoa seca, mas ó dotô, só fica seca quando num chove.
- Entendi. Está escrito aqui que o senhor quer comprar 10 cabeças de vacas. É isso mesmo?
- Lá vem o sinhô com essa história de novo. Eu quero é as vacas todas, com pés, braços, tetas e toda completa.
- É isso mesmo. Pronto! Enfim, o cadastro está pronto. Nós vamos analisar as informações e no começo do outro mês o senhor vem apresentar a sua proposta e saber se o banco vai emprestar os recursos financeiros destinados à sua atividade rural, com um plano especial de desenvolvimento sustentável, agregando valor e elevando a produtividade regional.
- Vixe! Num entendi nada. Se as vacas sair é o que eu quero. No começo do outro mês eu venho mais meu subrinho saber e levar o dinheiro das mimosas.

Bil vai voltar ao banco para saber se o cadastro foi aprovado e levar o dinheiro para comprar as 10 vacas. Será que ele vai conseguir? Só saberemos na parte três desse imbróglio.
João Bosco do Nordeste
Enviado por João Bosco do Nordeste em 24/11/2014
Alterado em 24/11/2014
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