História de um pescador – Capítulo III (último)
Como nós vimos no capítulo anterior, Guiça encontrou a mulher dos seus sonhos. Combinou com ela para fazer uma pescaria em noite de lua cheia. À noite ele foi dormir.
Quando acordou lá para o meio dia, foi procurar Mané Lambão, para pedir a chave da embarcação, pois ele precisava limpar todinha e botar perfume, para receber o “amor da minha vida”. Pensou ele.
Mané estranhou aquela disposição, mas prometeu que depois das quatro da tarde, poderia ir buscar a chave.
Ele foi até perto da casa mal-assombrada de novo, olhou para dentro do condomínio, e nada! Voltou para casa e almoçou “ninguém é de ferro” – pensou ele. Depois caiu no sono de novo, acordando atrasado às cinco da tarde. Levantou e correu para buscar a chave. Passou na venda de Guiomar, sua segunda ex-esposa, comprou perfume, talco e sabonetes caros. Pediu pão, presunto, sardinha, uma garrafa da cachaça “mata que é bicho”, azeitonas, bolachas, dois litros de água mineral e quatro peixes assados, enrolados em papel alumínio, para esquentar no barco.
Ela perguntou para quem seria tudo aquilo.
- Presente para Iemanjá. Respondeu.
- Mas o dia de Iemanjá é 2 de fevereiro, dia de festa no mar! Estamos em setembro. - Reclamou ela.
Mas ele disse que era uma promessa para melhorar a sua vida e a vida das suas três ex-esposas. Ele deveria jogar os presentes naquele dia, na noite de lua cheia, senão as coisas boas não iriam acontecer.
- “Fazer o quê? Se for para vir dinheiro para mim, tudo bem. Só não quero é mais ele. Deus me livre!” – pensou ela.
Ele foi ao barco, lavou ... lavou; secou ... secou; perfumou ... perfumou ... e deixou no barco uma lâmpada florescente, que funcionava com a bateria do barco, além de uma sacola cheia dos alimentos comprados na quitanda de dona Guiomar. Anoiteceu e ele foi para casa tomar um banho.
- “Ninguém é de ferro” – pensou de novo.
Às oito e meia da noite, ele já estava na frente da casa de pedra esperando o seu amor, mas ela não apareceu. Quando deu nove em ponto, uma luz no barco acendia e apagava. Ele correu para lá. Entrou no mar com água pelo pescoço, quase o encobrindo, até ver quem era. Seu amor já estava no barco.
- “Enganei ela direitinho. Ela vai comigo para altos papos em alto mar” – pensou ele.
- Meu amor, você já está ai? Puxa, você é pontual. – Elogiou o galanteador náutico.
Será que algum segredo ela se esqueceu de falar para ele? Quem sabe? Ela estava deitada, num vestido longo e branco. Um tesão de mulher à luz da lua! Aliás, parecia uma sereia pronta para ser devorada!
Ele subiu no barco, ligou o motor e começou a se distanciar da praia.
- “Como ela está linda, na luz da lua” – pensou ele. (ele gostava de pensar mesmo)
Depois de mais ou menos uma hora de navegação, ele parou e desligou o barco. Quis ser gentil e ofereceu comida, água, cachaça, bolacha ...
- Não, obrigado. – Ela respondeu com carinho. Que horas vamos começar a pescaria? Não estou vendo a rede. Só tem dois colchonetes onde estou deitada, e as coisas de um piquenique. Vai pescar de vara?
- Bem - começou a explicar, na realidade eu queria mais era ficar só com você, a coisinha mais bonitinha, e engraçadinha que eu já vi na minha vida. A vara até eu trouxe, mas vou usar na hora certa. Sabe, eu gosto muito de pensar. Eu pensei trazer o meu amor para um passeio e namorar muito.
- Ah! Foi isso? Entendi. Quer dizer que pescaria, nada? É outra mentira das suas? O barco cheio de peixes, como água, também era mentira? Deve ser por isso que estou sentindo que a água está entrando no barco. Você não está sentindo? Está enchendo como se fosse de peixes, que você disse que pescava.
- “O que vou fazer agora” – pensou ele, mas logo começou a gritar: Socorro! Socorro! Socorro!
O barco foi enchendo, e Lara, como era uma sereia, começou balançando o rabo e saiu do barco nadando. O barco foi afundando. Como estavam muito longe da praia, ninguém poderia acudir. Quando ele lembrou em ligar o motor, já estava tudo embaixo d’água. O barco já escava com o estibordo – lado direito, quase todo embaixo d’água, juntamente com a popa. Só lhe restava a proa – a parte de frente, e o lado direito, a estibordo, começando a fundar.
- Cadê tu, Aral? Cadê tu, meu bem querer, é segredo é sagrado, estou sendo afogado ó meu coração!
- Estou aqui mentiroso! Fez a promessa de nunca mais mentir, não foi? Eu sou Lara, a irmã de Iara, a Rainha das águas lembra? Você falou que o barco ficava cheio de peixes como água. Pronto. O seu desejo foi atendido. O barco está cheio d’água.
Tchibun! Foi embora. Ele entrou em desespero:
- Acuda são Gabriel, acuda São Cristovão! Acuda São Sebastião! Acuda São Simão! Acuda Santo Expedito! Acuda São Cipriano! Acuda meu santo Antônio. Acuda Nossa Senhora dos desesperados. Acuda ..... glub glub glub. Com tanto peso, o barco afundou o resto.
Quando ele abriu os olhos, acordou com a cara dentro do penico cheiro de mijo eu estava embaixo da cama, onde ele já havia mijado umas três vezes sem acordar, preguiçoso, estava dormindo umas 15 horas seguidas. Levantou o penico e estava lá, embaixo dele, um bilhete todo molhado e escrito:
- “Nunca mais vai mentir sobre pescaria”.
- “Ufa! Até mijo não é tão ruim. Ainda bem que foi um sonho!” – Ele pensou finalmente.
(Fim?)
(Palavra do autor: Se ele voltar a mentir, continuaremos contando suas mentiras. Deixa ele quieto!)
João Bosco do Nordeste
Enviado por João Bosco do Nordeste em 12/02/2015