O dia que ele saiu de casa – JOGRAL
(Um comentarista e dois atores para a representação)
COMENTARISTA: No Sítio da roça, numa cidade do interior, , havia uma família de agricultores que trabalhava a roça de sisal, em busca de dias melhores. Seu pai e a sua mãe, trabalhadores da agricultura familiar e ela ainda dona de casa, trabalhavam duro no corte e venda de sisal, para a arte da fabricação de tapetes, cordas e outros apetrechos, nas máquinas que mutilavam trabalhadores, sem qualquer controle social ou fiscalização.
Num certo final de dia, depois de muito suou e trabalho, um dos filhos disse:
O FILHO: Mãe! Eu vou embora daqui. Preciso estudar. Minha vida aqui não vai melhorar se eu não estudar, e não poderei ajudar a senhora e meu pai também criar os outros filhos.
COMENTARISTA: Ele estava decidido e apoiado pelo pai. No dia seguinte, pela manhã, havia um transporte de passageiros numa camionete pampa, que saia de Valente 5 horas da manhã e chegava em Feira de Santana às 17 horas da tarde. De madrugada ele se levantou, com a família quase toda dormindo, somente a mãe acordou e foi para o fogão de lenha esquentar um café e uns pedaços de pão para ele comer. Depois de tomar o café, e já com a bagagem pronta, ela passou as mãos nos seus cabelos longos, abraçou e chorando disse:
A MÃE: Filho vem cá. Para onde você vai? Aqui na roça é tão bom. Tem passarinho, tatu e codorna para caçar, tem chuchu, beiju, castanha, rapadura e farinha. Tem cobra venenosa e até picada de abelha. O que você quer mais?
O FILHO: Oxente mãe! Vou estudar em Feira de Santana. Lá tem cinema e estádio. Logo já vai ter uma faculidade, pá pá pá. Lá não tem cobra venenosa, mas tem muito mel de abelha boazinha.
A MÃE: Você é que pensa que isso tudo é uma maravilha. Mas por onde você for eu sigo com os meus pensamentos sempre onde estiver. Pode ir, pois eu vou pedir a Deus, que ilumine os passos teus. O mundo não é nada fácil e você poderá sofrer para vencer. Leve no coração tudo que eu e o seu pai ensinamos de honra, amor e caridade. Meu filho, vá com Deus, que esse mundo inteiro é todo seu!
COMENTARISTA: Na tristeza de uma esperança, o olhar da sua mãe na porta ele viu chorando, levantando as duas mãos para lhe abençoar. O carro estava saindo. Sentado no fundo da camionete no meio da estrada de chão em direção a Serrinha, para depois seguir para Feira de Santana, falou para seus amigos que estavam do seu lado na carroceria:
O FILHO: Eu sei que ela nunca compreendeu os meus motivos de sair de lá. Mas ela sabe que depois que cresce, o filho vira passarinho e quer voar. Ela me falou do mundo que eu iria viver, parece até que ela conhecia cada pedra do caminho por onde eu iria botar os meus pés.
COMENTARISTA: Pensando como iria mudar de vida, naquele instante bateu a saudade misturada com a poeira da estrada e um calor de perto do meio dia. Deu até vontade de voltar, mas quem tem destino no estudo não pode recuar em frente das dificuldades. Ficou em pé com o carro andando, em tempo de cair, e disse:
O FILHO: Eu bem queria continuar ali, mas o destino quis me contrariar. Terminei sendo secretário do Estado, professor universitário e secretário da prefeitura de Feira de Santana. Troquei a enxada pela caneta, a máquina de sisal pelo computador, as folhas de sisal pelas folhas dos livros, o banco da varanda da casa da roça pela cadeira dos escritórios, os coices dos bois, cavalos e jegues pelos coices de outros animais da cidade grande.
COMENTARISTA: Como assim? O que mais você trocou da roça pela cidade grande?
O FILHO: Troquei o leite dos peitos das vacas pelo leite de caixas dos supermercados. Troquei as estradas de chão pelas viagens de avião. Troquei a carroça da roça por uma carroça melhor da cidade.
Troquei a montaria na sela do jegue pela Tese do Semiárido baiano. Em determinado momento deixei de ser paciente para ser doutor, e do MOC fui ser professor.
Pensei que somente na roça a gente ficava velho.
Mas peraí! O que é que eu estou fazendo aqui mesmo?
COMENTARISTA: Hoje é o dia mais importante da sua vida. Saiba que nós não construímos o futuro, pois não nos pertence. Não construímos o passado, pois o que ficou será a nossa história. Não construímos o presente, por isso é hora de continuar construindo o presente, quando completa mais um ano de vida.
Receba o carinho dos seus colegas e amigos da Secretaria de Desenvolvimento Social, da Prefeitura de Feira de Santana, pois esta é uma data eterna para todos que lhe querem bem. (Cantar: O dia que eu saí...)
João Bosco do Nordeste
Enviado por João Bosco do Nordeste em 09/08/2017