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João Bosco do Nordeste
Professor Mestre em Educação e Administrador empreendedor
Textos
Joaquim Manuel de Macedo - A Moreninha - o honrado e o fecundo
A Moreninha é um dos maiores romances clássicos da literatura brasileira.
Para iniciarmos este texto é bom relembrar que as características principais do Romantismo são: a valorização das emoções, a liberdade de criação, o amor platônico, religião, individualismo, nacionalismo e história.
Analisando o capítulo “O honrado (que tem honra; honesto, digno, probo, casto, puro e virtuoso) e o facundo” (eloquente; falador), cujo texto retirado do Livro “Formação da literatura brasileira: momentos decisivos, de Antônio Cândido (p. 136-145)”, poderemos perceber uma análise global da obra de Macedo, entretanto nós vamos nos deter aos aspectos enfocados no capítulo 12 do livro A Moreninha - “Meia hora embaixo da cama” que foi contado por um narrador onipresente dos acontecimentos. Essa obra está dividida em 24 capítulos curtos, que poderiam ser lidos diariamente nos jornais como encartes (folhetins). O texto vai dando pistas para o desvendamento da trama de amor de Augusto e Carolina (a Moreninha).
O tempo da narrativa ocorre entre os dias 20 de julho e 20 de agosto, quando o narrador mostra a evolução dos sentimentos de quatro rapazes (Fabrício, Leopoldo, Filipe e Augusto), estudantes de medicina. Eles vão passar o domingo na casa da avó de Filipe, na ilha de Paquetá, onde Augusto conhece Carolina, jovem de 15 anos, a quem começa a namorar como apenas um amor passageiro, para atender a uma aposta que ele fez com os amigos, e se ele perdesse, deveria escrever um romance.
Após muitas peripécias, cenas cômicas e lances de desencontro, Augusto se apaixona perdidamente pela Moreninha. A história é muito simples, mas o enredo é complicado, mostrando elementos essenciais e estruturais na formação da cultura brasileira do século XIX. O culto à mocidade está presente na obra, destacando a responsabilidade da juventude na construção da Pátria, na renovação moral, e na formação de uma nova tendência literária.
O romance mostra as relações familiares e sociais, descrevendo os papéis femininos e masculinos, e propondo mudanças muito semelhantes àquelas defendidas pelo pensamento médico. As moças são descritas como sendo sonsas, fingidas ou maliciosas, porque se utilizam de várias e pitorescas estratégias para conquistar um marido. A Moreninha, por exemplo, mostra-se pura, mas hábil à sua maneira, na conquista dos homens. Em certos momentos o narrador mostra os seus dotes físicos e a aptidão para ser uma boa esposa e mãe. Já os rapazes são interesseiros e irresponsáveis. O romance é estruturado num conjunto de antíteses no enredo, na caracterização do personagem e na escolha da trama.
Segundo Antonio Candido, o romance de Macedo apresenta dois eixos narrativos: o eixo do real, em que a história começa e termina sob o signo da normalidade, e o eixo ficcional, formando o recheio do enredo, em que os personagens passam por situações de desequilíbrio. Macedo era conhecido como o “escritor das famílias”, além de conservador em literatura, política e historiografia, sendo considerado o iniciador do romance romântico no Brasil.
Como veremos no Capítulo 12 – “Meia hora embaixo da cama” (p. 68-74), havia a preocupação do autor com a formação do público leitor e em vários momentos, ao comentar a forma como a história está sendo contada, orientando como o leitor deveria ver a obra: “Pobre Augusto, não te chamarei feliz! (...) Porém, lembrando da exótica figura que se via, meteu a roupa que tinha enrolada entre os dentes, apertando-os com força contra ela, procurando iludir a sua imaginação”. (p. 71)
Antônio Cândido destaca que Macedo incorpora no romance os discursos dos grupos sociais:
– Que calor! ... exclamou d. Gabriela, afetando no abanar de seu leque todo o donaire de uma espanhola; oh! Não parece que estamos no mês de julho; mas, por minha vida, vale bem o incômodo que sofremos, o regalo que têm tido nossos olhos.
– Bravo, D. Gabriela! ... então seus olhos...
– Têm visto muita coisa. Olhe, que não é por falar mas, por exemplo, há objeto mais interessante do que d. Luisa mostrar-se gorda, esbelta, bem feita?
– É verdade! É verdade! – bradavam as três.
– E nós que a conhecemos! – disse d. Clementina. Fora é o que se vê e em casa, tão escorridinha!...Ora, nem se sabe onde lhe fica a cintura.
– É um saco!
– E como é feia!...
– É horrenda!
– É um bicho!
– E não vimos a filha do capitão com sua dentadura postiça?...Agora não faz senão rir!...
– Coitadinha! Aperta tanto os olhos!
– Se ela pudesse arranjar também um postiço para o queixo!
– Ora d. Clementina, não me obrigue a rir!...
– D. Joaninha, você reparou no vestido de chalim de d. Carlota?...Quanto a mim, está absolutamente fora de moda.
– Ainda que estivesse na moda, não há nada que nela assente bem.
– Ora...é um pau vestido!...tem uma testa maior que a rampa do largo do Paço!...
– Um nariz com tal cavalete, que parece o morro do Corcovado!...
– E a boca?...ah! ah! ah!
– Parece que anda sempre pedindo boquinhas.
– E que língua que ela tem!
– É uma víbora!
– Eu não sei porque as outras não hão de ser como nós que não dizemos mal de nenhuma delas (p.70).
Macedo inclui atitudes de temperamentos de mulheres e suas diferenças na vida urbana e rural, além de deixar registrado o universo mental da Medicina nos diálogos e o comportamento social da vida urbana, sobrepujando aos moradores da ilha, cujos costumes sociais se destacavam pela aparência, formação cultural e política. Macedo dá início ao mito sentimental, com a personagem Moreninha e valoriza os jovens como bons partidos para casamento, rebuscando no romance várias informações sobre os metidos da educação feminina, ao tempo em que a Moreninha ensaia sua vida adulta através de bonecas, se preparando para um possível namoro.
No capítulo, enquanto Augusto se encontra debaixo da cama, são construídos e apresentados pelas mulheres alguns dos elementos da vida cotidiana privada, como a fotografia, espelho, escrivaninha, a estética física, o diário, as fofocas, a moda etc., na construção da intimidade burguesa e da literatura romântica, dando pouca ênfase às circunstâncias sociais relacionadas à escravidão.
Antonio Candido ressalta o caráter de leitura estimulante e acompanhada de julgamento estético da prosa falada, num impulso irresistível de tagarelice, com piadas e devaneios à vontade, tendendo à caricatura, em qualidades textuais que justificam a sua obra rica em referências ao contexto social e mental do século XIX.
“Meia hora embaixo da cama” é, portando, no capítulo 12 do livro A moreninha, uma alegoria contada passa a ser registrada em histórias dos saraus, da moda, das pieguices, das fofocas e seus reflexos na vida social. Augusto (que nesse momento é o próprio narrador), escondido embaixo da cama, é o próprio ouvinte dos seus personagens falando das características dos costumes, gracejos e inquietações da sua época, passando-as para as próximas gerações de leitores.
A descrição fiel de vários temas é abordada de uma forma inteligente e às vezes até lúdicas, levando ao aparecimento do romance gerado partir das relações domésticas expostas entre bilhetinhos, olhares, danças, amizades e troca de olhares, tão simples quanto importantes para definir a estética do romantismo brasileiro, no seu mais tradicional desempenho.
Joaquim Manuel de Macedo estudou medicina, mas preferiu mesmo foi se dedicar à literatura, num contexto sociocultural no qual abordou os hábitos e os amores do Rio de Janeiro do século XIX, numa leitura fácil e envolvente.
A narrativa não muito extensa e que proporciona uma leitura fácil e agradável, capaz de arrebatar os corações apaixonados de todos os leitores com todo seu encanto de lendas e tradições. A Moreninha inicialmente foi publicada no formato de folhetim semanalmente nos jornais, marcando o início da prosa do Romantismo no Brasil.
Narrada em tempo cronológico e linear, a história retratada no romance ocorre em três semanas e meia, mostrando os hábitos da juventude carioca, nas festinhas, saraus e namoros singelos.
Mostra o autor que o amor verdadeiro nasceu na infância, e depois é retomado no meio do livro, num relacionamento difícil na primeira metade do século XIX.
A Moreninha lembra as histórias dos amores impossíveis, dos amantes que são separados injustamente, mas fala também dos destinos que não podem ser mudados, de um amor que não acaba e de corações apaixonados que voltam a bater mais forte quando estão perto um do outro, numa lírica que perpassa pela lenda da gruta, quando dona Ana conta a Augusto a origem da fonte que foi criada a partir do choro de uma índia que foi desprezada pelo amado, e quando o amor dela dormiu na gruta e bebeu daquelas lágrimas, ficou apaixonado tomando aquela água milagrosa, fazendo adivinhar segredos uns dos outros.
Para delinear um final feliz, Carolina na gruta se revela mostrando o camafeu para Augusto, renascendo o amor e marcando o casamento.
Tudo indica que Augusto (Joaquim Manuel de Macedo) acabava de conceber o seu romance para ser escrito e lançado, registrando essa história que está viva e lida até os nossos tempos.

Fonte: http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action&co_obra=2023
João Bosco do Nordeste
Enviado por João Bosco do Nordeste em 12/09/2023
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